quarta-feira, 21 de setembro de 2011



Para estrear o Frente a Frente, contamos com a ilustre participação do Professor Ozanir Roberti Martins. Confira abaixo a entrevista!

Bípedes: Em vista do feriado do dia 7 de Setembro, não podemos deixar de pensar na independência do nosso país, que está intrinsecamente relacionada à liberdade política, econômica e social que obtivemos desde então.  Não podemos esquecer também a nossa língua: falamos o idioma português por causa de Portugal. Contudo, é nítida a diferença existente entre o português realmente português e o brasileiro. Como o senhor enxerga essa emancipação, digamos assim, da nossa língua? Como o senhor vê essa questão de língua e liberdade?
Prof. Ozanir Roberti: Na verdade, eu penso que hoje a situação histórica até se inverteu. Nós temos uma língua que buscou a liberdade de Portugal. Depois da independência, a própria literatura encontrou caminhos para fazer com que a nossa língua tivesse contornos iguais aos de Portugal, mas que rompesse de vez em quando esses limites. É o caso dos poetas românticos, como, por exemplo, Gonçalves Dias que começa a utilizar expressões indígenas. É o caso de romancistas como Alencar, que, aos poucos, vai fazendo suas obras terem palavras vindas da cultura indígena, que começa a colocar o pronome de maneira diferente de Portugal. Para a nossa língua, a independência, sem dúvida, é uma espécie de marco, um marco que traz uma certa incorporação de novidades linguísticas em relação a Portugal, diferenciando o Português daqui do de Portugal. Porém, de lá para cá, com o passar dos anos, a mudança é realmente muito maior. Nós temos um vocabulário muito mais amplo que o de Portugal; principalmente pela aquisição de palavras de origem africana, as próprias palavras indígenas que eu já citei, e especialmente pela chegada de imigrantes não portugueses que trouxeram inúmeras palavras que acabaram incorporadas ao nosso idioma. Além disso, há um outro fator que é muito interessante. Talvez essa “frouxidão” na formação do português do Brasil tenha revelado um espírito altamente criativo. Então, nós criamos palavras com muito mais facilidade que o português de Portugal, e hoje o que se tem é uma atração muito maior do estrangeiro pela Língua Portuguesa do Brasil do que pelo Português de Portugal. Dessa forma, o nosso português seria o que está na moda, enquanto o de lá é bem menos atraente. Então, isso é, na verdade, uma forma de libertação. Não uma libertação que rompa os laços. Nós continuamos usando a língua portuguesa; mas uma língua portuguesa com um colorido próprio e, além disso, com uma força que parece acompanhar o potencial econômico do nosso país.

Bípedes:  “A norma culta é um instrumento de dominação das elites.” O que o senhor acha?
Prof. Ozanir Roberti: Não é verdade. A norma culta talvez seja mais difícil de ser conhecida. Logo, a elite, quase sempre, tem mais oportunidade de conhecê-la. Contudo, há muita gente de uma elite no Brasil hoje que desconhece completamente a norma culta, a qual, na verdade, deveria ser um instrumento posto à disposição de todos os cidadãos, para que tivessem os mesmos direitos. Se isso não ocorre, é porque a educação no Brasil ainda é muito incipiente, mas eu acredito que seja um estágio por que nós estamos passando, e que ela, no futuro, ao contrário do que muita gente pensa, será bem mais espalhada por aí.

Bípedes: Como o domínio da língua culta pode contribuir para o futuro do país?
Prof. Ozanir Roberti: Pode contribuir principalmente no avanço científico e tecnológico. Não há como negar que toda a parte de apoio intelectual, acadêmico, precisa da norma culta; a descoberta cientifica e o ensinamento técnico-científico dependem da norma culta. Então, o quanto mais nós conseguirmos desenvolver essa parte do ensino, especialmente na área tecnológica, mais nós vamos depender da precisão, da exatidão que se faz exatamente através da norma culta. É uma questão de necessidade real para o desenvolvimento tecnológico do país. Nós, na verdade, estamos muito atrás de países como Japão, Noruega, Coreia; é como se tivéssemos dois Brasis, o Brasil que consegue acompanhar, que é o Brasil de uma minoria, e aquele Brasil da grande maioria, que está defasado, e defasado tecnologicamente, porque está defasado linguisticamente. 

Bípedes:  A Internet está empobrecendo a linguagem culta?
Prof. Ozanir Roberti: Não. De maneira alguma. O que você tem na internet de diferente é apenas a ortografia. O garoto que escreve abs não lê abs, ele lê abraços. Então, a língua é a mesma, o que muda é a ortografia. Da mesma forma, temos aquela menininha que faz um elogio e coloca você é D+. Eu não leio aquilo como uma letra e um sinal de mais; eu estou lendo a palavra demais e entendendo que, quando ela diz você é D+, está fazendo um grande elogio. Assim, a língua da internet é a mesma língua que nós temos no nosso dia a dia. Ela tem uma aproximação mais real com a língua, não se discute isso, mas esse pessoal que acha que aquilo é uma língua diferente está totalmente errado. O que se tem é um registro diferente da mesma língua.

Bípedes:  Professor, qual seria a  mensagem para nós estudantes de letras,  no início de mais um período de formação?
Prof. Ozanir Roberti: A mensagem que gosto de deixar é sempre positiva: estudem. Saber não ocupa lugar; quanto mais vocês souberem, mais vocês estão preparados para as mudanças do futuro. E não tenham dúvida, a rapidez com que o mundo está mudando vai exigir que vocês estejam sempre preparados para essas alternativas. Vocês não devem se prender somente àquilo que querem, àquilo de que gostam; vocês têm de estar preparados para o que o mercado vai exigir de vocês. E, na nossa área, que é a da linguagem, os horizontes são muito amplos, cada vez mais amplos.

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